28 de mar. de 2012

Governos sem preocupação com o consumidor



O tempo econômico pode ser dividido em duas etapas: o tempo de crise e o de calmaria.
As crises abrem espaço para medidas heroicas, as grandes transformações que não avançam em tempos de paz. Períodos de calmaria são adequados para apertar os parafusos, acertar pontos vulneráveis, melhorar incrementalmente a economia.
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Dias atrás mostramos aqui a inutilidade da taxa Selic em função dos altíssimos spreads bancários (a diferença entre taxas de captação e de aplicação).
Reduzir o spread bancário não interessa apenas à política monetária. É ponto central para o desenvolvimento do país, para legitimar o sistema bancário e para dar solidez ao mercado de consumo.
Um exemplo simples:
Um chinês e um brasileiro ganham, por exemplo R$ 1.000,00 mensais. O brasileiro paga 4% de juros ao mês em financiamentos de 24 meses; o chinês para 0,5%. Só por conta desse diferencial, o poder aquisitivo do chinês será 48% maior que o do brasileiro. Ou seja, com o mesmo valor de prestação, o brasileiro poder comprar um bem 48% mais caro que o brasileiro.
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Um dos bons trabalhos do período Antônio Palocci foram as tais micro-reformas conduzidas por Marcos Lisboa. Graças a elas, se desenrolou o imbróglio dos financiamentos habitacionais, emperrados desde o fim do BNH, nos anos 80.
Ontem, o Ministério da Fazenda divulgou um estudo econômico com críticas ao spread bancário para o tomador final – pessoa física e jurídica.
Para sair da crítica para a ação, o primeiro passo é um diagnóstico preciso das causas do spread. Diagnósticos não faltam. Existe a tributação que teria que ser revista, regras de apropriação dos inadimplentes. Mas existe, fundamentalmente o problema da concorrência.
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E aí entra um ponto central de desvios de função de governo, que vem do governo FHC, atravessa o governo Lula e se perpetua no governo Dilma: a incapacidade das agências reguladoras de imporem normas aos regulados.
Esse problema é visível na Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). Montou-se um modelo em que, pensava-se, a competição seria a garantia de qualidade e preços. Na prática, criou-se uma segmentação de mercado, especialmente na telefonia celular: de um lado operadoras com serviços abaixo da crítica, que cobram preços menores; do outro, operadores com melhor qualidade, que cobram preços abusivos.
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No caso do BC, há muitos anos se sabe da falta de competição no mercado bancário e de práticas que afrontam leis de direito econômico e de defesa do consumidor. Mas nada se faz.
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No fundo, quando se discute a questão da privatização ou concessão de aeroportos, a dúvida que paira é se as autoridades reguladoras (ANAC, no caso dos aeroportos) serão defensoras dos direitos difusos dos consumidores. A única preocupação da ANAC parece ser a solidez financeira das companhias aéreas.
Em outros setores onde já existe concessão – sistema bancário e telefonia – essa ação reguladora é imperceptível, em relação ao consumidor. Se o que já existe, não funciona, qual a garantia de que a regulação funcionará a favor do consumidor?
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Depois de consolidada no primeiro ano de governo, penso ter chegado a hora da presidente Dilma Rousseff mostrar que o consumidor tem espaço em seu governo. Até agora, não mostrou.

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